Emaranhado

Caminho e paro em meio esta multidão de faces que me cercam. Tão cheio de "ninguens".

Olhos cruzados, mãos que se tocam e sentimentos lineares.  Eu ando num espaço aqui dentro vazio, tão cheio de vazio. Palavra redundante em minha vida. Um paradoxo absurdo e invisível aos outros.

Impiedosa verdade, aqui não existe se eu abrir os olhos. Ela adormece. Pessoas se esvaem sem controle, eu gostaria de saber o que isto significa. Para onde vão, se irão voltar. Pra que retornariam.
Ontem estávamos de mãos dadas, mas eu sei o poder do tempo e os estragos que ele é capaz de fazer.

E lhe é retirado do peito, abrindo espaço pra reposição e repetição dos erros. Nos nunca paramos de errar. Trocamos os personagens da mesma tragédia de tempos em tempos.

Vocês tem noção de quantas vezes me fizeram chorar? De quantas vezes me fizeram morrer? É um instinto que me domina essa dor. Uma perseguição calculada meticulosamente. Não há santos. Não há vítimas. Há apenas a realidade.

Se eu me dedicar ao vazio, poderia esquecer sem sequelas, deixando o espaço oco ser preenchido por futilidades me dopando da realidade. Mas não seria eu.

Engraçado, eu ja disse e pergunto, porque vocês participam disso? Isto não fez sentido pra ninguém, só para mim. Sumam daqui!

Como existem sonhos que não podemos realizar, existem vidas e caminhos que não podemos escolher. E todas as tentativas são apenas justificativas. Eu não preciso de soluções pois não tenho problemas.

Sigo assim, peneirando a tempestade que assola minha jornada, sepultando pessoas vivas, trocando de estradas, me atirando em precipícios. Eu sou um dos poucos que restaram. Vivos mas não intactos. Derrotado mas não rendido. Exausto sim, morto não.

Enquanto eu olho dentro de vocês, sobram insistências em tentar enxergar a superfície de algo muito mais profundo.

Esta bem. Eu cansei por hoje. Estou apenas matando o tempo.

Selado

Eu não consigo ver uma forma de escapar. Aos seus olhos tudo parece simples. Para aqueles que caminham na superfície, nada além de opção. Eu não sou uma opção, eu sou uma sequela. Uma ferida que não fecha porque os cortes vem e vão.

Eu não decido sangrar, eu apenas não cicatrizo.

E não espero que exista compreensão, não há compreensão. É um fosso de incertezas e abandono, um abandono mental que é infinitamente maior que o físico, e hoje em dia eu vivo a mescla dos dois, e é torturante.

Me revolta a cegueira, a incapacidade generalizada, mas o que eu posso fazer? Eu não consigo ser aquilo que não consigo ser.
Um sinal de que nunca fingi, e de que raros são aqueles que lutam uma vida inteira para serem apenas verdadeiros dentro de si. Não me orgulho disso por completo, mas também não posso me condenar e fim.

Eu desabafo, abafo, desafogo, sufoco. Mas tudo rebate, retorna, é incerto e incompreendido. Um julgamento por quem não entende é simplesmente uma retaliação.

Eu não tenho escolha, tenho busca. Uma procura até agora infinita pela razão de cada ponto, de quando eles irão se conectar e me mostrar a imagem que for, boa ou má, cruel ou generosa, mas que enfim me traga uma clarevidência do propósito de todos estes anos que se passaram.

Anos estes ricos em histórias, em conquistas e derrotas, em saltos de fé e portas na cara, capítulos e mais capítulos na minha breve passagem.

Talvez eu me despeça sem um ponto final. Sem realmente ter entendido a razão, e se eu não o fiz, impossível que façam.
Eu deixo não um legado, não sou ninguém aos holofotes amarelados, não são digno de aplausos ou inspiração incoerente, deixo um registro de passagem, um atestado de quão conturbante é estar aqui querendo realmente estar. Eu nunca aceitei ser transparente. Quero me ver e ser visto por aqueles que pouco enxergam.

A cada amigo que se virou de costas e deu com os ombros, cada pessoa que não foi capaz de olhar para algo maior em mim, cada ente da familia que espera por uma mudança, por um fim dessa chamada erroneamente rebeldia, eu aviso que não há volta.

E que não batam palmas quando tudo terminar. Por favor.