Querer

Mais que ter, mais que poder. Ser.
Querer constituir, entender, se tornar. Querer melhor sempre, que se fale bem, se entenda, que una e não separe. Querer uma vida sem medo, sem dúvidas do que é, sem vergonha do que não é. Querer ser belo e puro naquilo que faz, nas suas crenças, suas falas, atos, idéias. Querer como se quer à sí próprio, evitando atingir para não ser atingido, evitando dor para não sofrer. Querer ter forças para entender cada desavença, evitar cada contraste de mentes, pequenas arestas que destoam de qualquer perfeição. Querer ir aonde se tem vontade, sentir na pele tudo e qualquer sentido, o tapa que arde é o que te faz entender. Querer aquilo que seu coração pedir, de verdade, a cada pulso um aviso, um assopro que te empurra pra mais perto da glória. Querer que os que te amem sejam amados, que compreendam cada dificuldade e dor, e que estendam as mãos, "eu ainda estou aqui". Querer que se repitam as vezes que os sorrisos encobriram as lágrimas, te fizeram melhor, mesmo não sendo perfeito como pediu. Querer vencer qualquer luta, mesmo a batalha que te derruba, te traz força pra não cair mais, não da mesma forma. Querer acreditar que pode acontecer sempre que você tentar, que focar em se permitir todo e qualquer sentimento, te fará vivo. Querer deixar feliz aqueles que te fazem feliz, que batem palmas sinceras, que pedem mais de você quando falta, quando se quer estar bem. Querer ir longe, bem longe, onde sua mente te puser e seu peito tiver forças para te levar, alí, você estará feliz. Querer força, muita dela, para não perder as rédias, não soltar as mãos quando outras tormentas chegarem, quando as travessias foram tão largas que só juntos alcancem o outro lado. Querer de tudo um pouco daquilo que se quer, experimentar o sabor, o ardor ou afago, de ter conseguido. Querer viver bem, por mais duro que possa ser viver sem entender, mas que consiga viver bem de dentro pra fora, e não de fora pra dentro. Querer lutar por aquilo que bater o pé, sendo uma reação natural, do fundo do peito. Querer que estejam todos alí quando você precisar, querer, sentir falta. Quando chorar de alegria ou sorrir de tanta tristeza. Querer poder dizer tudo que precisar ser dito, antes que não exista mais como, antes que falte deixar tudo claro. Querer assim, de imaginar poder, de desejar conseguir, de conquistar de verdade. Querer que amanhã se junte com hoje, que veio de ontem. De tudo um pouco, um pouco de tudo, mas querer.

Eu quero. E você?

Destoante

Um intransitável espaço, onde fico a mercê de qualquer brecha para sair. Eu flutuo entre meus próprios medos, esbarro nas paredes dos labirintos que criei, áspero, pontiagudo, úmido e frio. Hoje estou resgatando pedaços de papel queimado, palavras esquecidas, lembranças destruídas.
Quantos deuses terei que criar antes que eu desista de fé, sepultando as minhas verdades sem ritmo? As vezes eu desperto sem razão, procurando motivos para continuar, seguir em frente para um destino desconhecido até hoje. Mas eu persisto, insisto, acredito naquilo que não vejo, como muitos fazem a toa.
E vejo seus rostos, eles brilham e reluzem, transparece a cor da mentira. Eu vejo seus pequenos universos cheirando a cinzas, um pequeno mundo dominado por todos. Eu bato o pé, eu não faço parte de histórias com capítulos repetidos.
Eu atravessei fronteiras, releguei e elegi novos horizontes, um universo antes intransponível. Poderia dizer tudo que não faz sentido, tudo que guardo e engulo, ou esqueço de falar. Mas eu deixo aqui.
São todos semelhantes, são as mesmas pessoas, vestidas diferente. Todos são pardos, pálidos, felizes e doentes. Eu vejo muita dor, muita ruína e destroços. Não existe palavras que descrevam os contornos de quem esta no fim.
Apenas um rosto a mais, eu passo por eles todos os dias, despercebidos, desatentos. Meus deuses se intercalam, entre salvadores e matadores, é quase sempre tudo ou nada. 
Toda decisão é dura e machuca, mancha a pele, sangra os olhos, busca razões irracionais para fins racionais. Eu ando de lá para cá, onde estará você? Eu parei e perguntei novamente. 
Agora que minhas pernas estão dormentes, eu tenho problemas, são internos, são minha bomba relógio, um curto pavio incandescente. 
Todas aquelas coisas que são melhores esquecidas, tiradas e destruídas. O que você faz aqui? O que te atrai em minhas palavras dislexicas e sem sentido?
Hoje eu deixo você ir sem respostas, sem verdades, sem perfeição. Hoje é tão imperfeito que se fosse fácil dizer o que quero, eu me calaria. 
Eu olho para tudo e não vejo nada, eu estou aqui, mas não tente me encontrar.