Transplante



Um brinde as mentes brilhantes que são capazes de tirar de dentro de nós emoções.
E por isso que eu sinto e falo, que escrevo, que transmito a sinceridade interna. E não sei ser bom, e gostaria muito de poder transmitir tamanha bondade que merecem algumas pessoas. Almas que não querem nada além de viver, de sentir a força e energia de gestos simples, de caminharem por um caminho melhor que apenas pedras e espinhos.

E admiro aqueles capazes de doarem amor. Aqueles capazes de ver além de seus olhos. Mais longe do que a visão pode alcançar. Gostaria muito de acreditar que um dia eu consiga tirar de dentro de mim o mesmo. Se é que existem realmente estas pessoas.

Dar-se por completo. Doar-se a quem ama. Os pequenos prazeres que a vida nos dá são os mais valiosos. Nada mais perfeito que o movimento infinito das ondas, que a brisa suave e o brilho do sol. E nada mais justo que por termos essas dádivas, contemplá-las.

E o tempo me faz ver a diferença entre pregar o bem. Entre escrever as palavras que meu instinto me conduz, além de tudo que eu achava que deveria fazer. Os dias que penso em querer viver algo diferente me transportam ao que eu não posso entender. Mas não quero me doar ao sofrimento que consome os meus dias e passo a respirar melhor, mais calmo, mais serene. Quem sabe um futuro me faça vivenciar estas emoções, me faça consertar as maquinas quebradas, e doar o que de bom eu tenho mais ainda aos bons que à mereçam.

Minha vida à chance de viver.


Lobos


Não sinta a dor.
Por dentro não existe saída quando você mesmo se enforca. As palavras não são compreendidas, se perdem ao vento e dissolvem a realidade. Não acredito em milagres. Evolução ou involução.
As vezes gostaria de não pronunciar tanto esta palavra: "não". Mas como substituir o negativismo que cerca nossas vidas?

Seria perfeito se não existissem frustrações e se todos os caminhos levassem a gloria. Mas essa verdade não existe e então, me alimento, me consumo com o poder destrutivo da realidade. Como digo sempre, as vezes não gostaria de enxergar tão bem as profundezas obscuras das verdades, mas estou fadado a isto. Luto, porém ao despertar como com um punhal nas costas expressando um sinal de "não pare, não desista, veja, continue sentindo", eu volto a escrever.

Talvez isso passe despercebido por sua existência, talvez até pela minha, mas é inevitável o alívio que consome minha alma nestes momentos. Me desprende da dor, do que você jamais sentiu, do que vocês desconhecem. Grito seco, ardido, inflama e destrói sem explicacão. Uma presa de si mesmo, uma vítima sem condenação, um culpado sem crimes.

Creio que um dia eu escape desta tempestade eterna, passando por raios e ventos, tentando encontrar o caminho entre as pedras que esfolam meus passos. Creio em mim, espiando você e tentando não me notar. Percebam os detalhes, eu repito.
Sabio aqueles que vivem como ovelhas. Pelo menos, a morte é certa.


Sapato Preto I



Sob a luz da lua apenas o vulto suave de suas curvas contrastavam diante de seus olhos. E aquela visão sempre hipnotizava e agradava. E um dia aquela paisagem foi desdenhada, e não haviam pessoas que gostariam de estar ali, a não ser ele, que sempre brigou dizendo que as melhores momentos de sua vida, ele passaria contemplando aquele belo lugar. Em tempo claro e brilhante, em tempos nublados e tristes. Desejo.




A história real era assim:
"E por muito tempo, apoiando os braços nas grades que impediam a entrada, sonhava do lado de fora. Caminhava rente aos muros, tentando achar um espaço, um pequeno buraco capaz de faze-lo invadir este local e mesmo que ilegalmente, desfrutar de pelo menos um momento daquela maravilha. Mas não o fez. Não porque não achou espaço, sim, encontrou, mas por querer mais que apenas uma noite de invasão.

E pouco a pouco, com trabalho e persistência, por desistência de antigos "donos", a oportunidade de ter aquele belo local surgiu, e não foi disperdiçada. E ele nunca havia se encaixado tão bem como naquele momento. Nunca mais iria deixar escapar. Novas cercas, e atenção e cuidado totais. E dia após dia, esquecia de todo o resto para ter aqueles momentos eternizados. E conseguia o retorno, se sentia bem, se sentia seguro.

E a natureza retribuia "




Nos sonhos mais distantes tudo se contempla. Onde apenas quem está vivendo aquele momento se satisfaz. Ninguém capaz de entender. Proibido, mas perfeito, e não existe a culpa, não existe o impossivel. Impede os sentidos. E a construção da paisagem se torna irretocável. Sem arestas ou farpas.


E perdido em meio a multidão.
Olhos para esquerda. Olhos para direita.
Ponte.


Orvalho



Como são simples os detalhes das rosas. Naturais. Os contornos de suas pétalas, as formas suaves que contrastam com seus espinhos doloridos. Se abrem de tempos em tempos, mostram sua pureza, suavidade. Expressam a delicadeza e a dor de forma nua e crua.
E nós imitamos as rosas. Dias fechados e relutantes, sombrios e nebulosos, onde nada mais importa do que se trancar dentro de si. Respingar a chuva, esconder-se do sol, lutar contra o vento.
Castigada pelo tempo.
Dias em estado de graça. Abertas e reluzindo imponência, força, beleza e perfeição. Chamam a atenção de todos, adornam espaços, combinam com o mundo, transmitem sentimentos e conquistam sentimentos. Exalam o odor da volúpia e do instinto. Profundas beldades.

O mais incrível no entanto é saber que elas, as rosas, não se dão conta de todo este poder. Simplesmente são usadas. Dó das rosas, dó como vítimas das imperfeições humanas, choram por nós, riem por nós. Sequestradas pelo simples fato de serem perfeitas. Dó das rosas.

Quanto mais eu insisto em me calar, me vejo refém das palavras que conduzem meus dedos. Não acreditem nelas, eu desconfio delas, vejo pequenos espaços, e passo por eles sorrateiramente. Não confiem como eu não confio. Confuso como quase sempre. Não devo tocar dentro de ninguém.
E onde estão as rosas? E será que para elas eu seria perfeito? E porque falar de rosas? Para expor os espinhos. Aonde ele quer chegar? Perguntas, não respostas.

Botões fechados, inverno. Não procure por elas, elas se foram. Mais um tempestade, e a vida segue. Porque falamos de rosas Deus?


Flerte com a Insanidade



Pouco a pouco, dia após dia.
Como um vírus que consome seu corpo até os últimos suspiros de vida, sem trégua, sem parada. Sinto que minha mente se entrega a uma força que não consigo controlar. Algo que bloqueia ações, algo que destrói sensações, que destrói cada pedaço de esperança. Incontrolável por meios normais, impossível de ser parada, torce minha mente em um espiral de conflitos que poucos resistiriam.

Travar uma luta parece desigual e insano. Principalmente porque uma batalha não vence uma guerra, e guerra não são vencidas sozinho. E assim que me sinto. Pessoas que não enxergam fatalidades, que custam a acreditar em pequenos sinais, que revelam a fragilidade de uma mente conturbada, que clama por salvação. O que parece piada se torna sério a medida que tudo ao redor desaparece, chances, vitórias, conquistas, vida.

Por mais que pareça ser irreal, maquiando algo banal chamado por muitos como preguiça, ou algo do tipo, só quem vive esse buraco negro sente a força dessa doença psico. Como seu cérebro tirado de dentro de seu corpo e colocado em um cofre, uma caixa isolada e travada de onde não se consegue sair, nem em forma de pensamentos. Reflexos dentro de si, uma casa de espelhos, um labirinto de repetições dolorosas e torturantes.

Pelo menos ainda me rebelo contra essas angústias e transponho através de palavras os muros e rebeliões da minha mente, lutando por um fio de esperança, um segundo de paz. Cravo minhas frases em rocha, para toda a eternidade, para todo o sempre, mesmo que um dia, nem eu mesmo seja capaz de dizer que sonhei...

...que eu mesmo, tenha escrito isto aqui.


Cativeiro



Já com o corpo dolorido da noite passada, mesmo sem conseguir abrir os olhos. Deitado encolhido com frio e sem espaço para se esticar. Ele pensava que aquilo era um sonho, não entendia porque de tudo isto estar acontecendo justamente quando parecia estar tudo bem. Uma pequena luz clareava as sombras de um inferno, onde se ouviam vozes e ruidos, vento e chuva.

A dor aumentava, sem controle, uma ânsia crônica visitiva seu corpo sem perdão. Mal cheiro, as vezes era melhor não respirar. Uma após a outra, suas esperanças iam dissolvendo, como em um paredão de fuzilamento, sem trégua. Ele não sabia se seria o próximo. Novamente a dor protagonizava os fatos. Um gemido para aliviar. Gritos são proibidos, condenados, punidos. O sangue desistiu de escorrer de suas feridas, nem ele possui forças pra lutar.

Não existe nada mais mortal que a falta de perspectiva. E ela invadiu seu corpo naquele momento, se apoderou, tomou conta de sua alma e cortou todas as raízes. Olhava para os lados, mesma visão, a dias. Torturante.

Passos fora do local. Esperança, pensa ele. Por um segundo seu corpo renasce, seus olhos se arregalam esperando ver o que a meses não podia. Dentro das veias o sangue luta por espaço, revigorando. Olhar fixo em direção ao que se aproxima.
Luzes, passos rápidos, palavras misturadas, barulhos. A voz que estava a distância agora sussurra em seu ouvido. Um puxão em seu cabelo, um tapa, ódio e dor.
Instinto, seus olhos se fecham novamente, o transe contínuo volta com força total. Coma.

Mais do mesmo. Sem fim jamais.



Chamas


Sem inferno, ou céu.
Dia após dia o que se vive é a historia que preenche os espaços marcados. Não há perdão, segunda chance, subornos ou ressurreição. Cada marca no rosto é definitiva. Os olhos secam com a força das tempestades de areia, ardem ao toque, sufocam até matar. O que não pode ser evitado.

Quanto mais a alma entra em agonia, mais palavras perdidas são ditas e eternizadas. A razão se perde entre os labirintos de um mundo que ele não gostaria de enfrentar, mas está cravado ao seu redor. Nada daqui se levará, nada será lembrado quando os olhos pela última vez fecharem e a respiração dormir. Pronto, terminou.

Quantas sobras de vida passaram despercebidas e nada permaneceu. Histórias banais, momentos sem lembrança, pequenas gotas de um prazer forjado e maquiado. Não existia o pecado, a luxúria, o inferno, o céu. Seus dedos rasgavam a pele e seus gritos ecoavam por aquele quarto úmido e quente. Suor, suspiros e confissões. Maestro do olhar, conduz seu desejo como um assassino em série, preparado pelo tempo para nunca errar.

Nada de correto em seus atos, muito menos de errado. Os anjos comem e dormem, sangram e sofrem. Mais justo que isso, apenas acreditar em sua morte.

Anjos do inferno.
Demônios do céu.



Precipício



Sobre as montanhas que quase tocam o céu, os braços abertos como querendo abraçar o mundo. Do alto nada se torna impossível, nada se torna grande o suficiente para desaparecer com o brilho do sol que ilumina seu rosto. Para os lados nuvens, pássaros, e o horizonte.

Queria ele saber planar, se atirar do mais alto pico e flutuar sobre seus próprios medos. A doce sensação do poder. Queria um dia sentir o mundo como os pássaros. Com a simplicidade que maqueia o medo, com a falta do temer, com movimentos simples e perfeitos. Nada além dos braços novamente abertos.

Pés doloridos pela caminhada, por uma subida sem tréguas ou alívios. Passo a passo. Nem o suor arruma tempo para aparecer. A escalada sozinho é mortal e não permite pensar. Desistiria. Fome, cede, dor. Cede, dor, fome. Dor, fome, cede.

Olhos para o infinito. Dois passos, bem próximos. Mais um e ele transpõe uma barreira sem volta. Chora, treme, teme, e quase sucumbe ao desistir. Mas estava decidido a descobrir o que ninguem mais poderia lhe contar, o que ninguem nunca poderia lhe proporcionar....

Mais um passo, fim.