Sucumbir

É difícil pra maioria enxergar o próprio fim. Não pra mim. É sufocante e ao mesmo tempo didático. Não há barreiras além do resto de consciência que te arredia e te segura. Mas não pra sempre. Chegará o dia. Chegará o fim.
Não é justo que alguém carregue o peso imenso deste fardo que sou eu. Ninguém merece sofrer a vida dos outros. O destino dos outros. A maldição dos outros. 
Você nasce pra sua morte. E ela virá da maneira pré-destinada, sem aviso, sem alarmes, sem explicação. E sem escapatória.
Esses dias atrás me aproximei do seu encontro. Segundos me tiraram da frente, é, ainda não era a hora. Flerto com ela, e me vi assim, sem nada que me impedisse, sem nada que me prendesse. 
Naquele momento toda a vida esbarra e te arranha, tudo que foi visto, vivido, passado, sentido. Te coloca em uma balança de verdades, mentiras, e perdão. Eu não me perdôo. Talvez nunca o farei. Nem mesmo sei do que deva me perdoar. 
Eu não terei tempo de me desculpar daqueles que eu deveria faze-lo, nem me lembro mais. Talvez alguns me devessem desculpas, isso sim. 
Sei que pra você esta sendo pesado, cansativo, difícil, sem querer sufocante. É, não é fácil viver próximo à mim. Exige batalhas e longas e profundas respiradas. Acredito na sua força. Ainda acredito. 
Pois não sou de todo mal. Quando eu partir, sua lição ficará. Lembranças não dissolvem quando foram sentidas na pele, no peito, dentro de ti. Você terá seu tempo de lembrar e sorrir, assimilar, e compreender um pouco mais sobre a minha passagem duradoura. 
Enquanto esse tempo não vem, eu estou aqui escrevendo mais um pedacinho do fim...

Escorrendo

Desta forma, que as palavras se escondem, o silêncio me cala, me acua temendo o que não posso entender. É um anestésico natural, sistema de defesa, um véu que cobre a alma quando o desespero se prolifera.
Passo dias sem pensar, enquanto eles me consomem, eu fico a deriva sem norte, me arredio e me revolto no escuro. Nenhuma saída me tira daqui, são infinitas entradas, infinitas passagens.
Mais de trinta dias que não me deixo sangrar, que não permito ao meu peito explodir em revoltas e incertezas, palavras estas que uso tão frequentemente, que se tornam redundâncias macabras de um disco riscado, um looping infinito neste espiral de sofrer.
Ninguém aqui é convidado, ninguém aqui quer ficar bem, aqueles que aqui se encontram fazem parte de um juri sem réu, um processo de condenação por ser aquilo que sou, e refletir em vocês, e nada mais que isso.
Ando a procura de tudo que sempre quis, releio catástrofes, recrio cenários, assassino os bons, e replico os maus. E assim vou me reinventando, me suprindo das migalhas que a vida joga, e me suborna a acordar mais um, e mais outro dia, e assim por diante.
Quantos de vocês gostariam de gritar? De renascer do avesso com tudo aquilo que não te deixa feliz, no lixo. Quantos engolem seco uma vida sem propósito, pelo simples fato do propósito ser a vida, e não a vivência. Se você se encontra em pedaços daqui, é um fragmento de tudo que sou, e um bocado de você, que não se deixa livrar-se.
Convivo hoje com uma realidade aleijada, parte excelente parte deplorável. Arestas a serem aparadas, espinhos arrancados para que floresça a paz. Tão tão difícil paz.
Talvez você acredite ser capaz de entender cada linha de tudo que eu deponho. Talvez você recrie fatos pessoais e me transporte pra dentro de um universo só seu, onde eu não pertenço, a não ser por detalhes egoístas.
Eu ando bem preocupado com tudo, nenhum novidade. Turbilhando a mente a procura de respostas sem solução, olhando pra frente só.. bem lá na frente, imaginando que um dia eu saia de todos os labirintos que existem aqui.
Meus gritos são antigos.. volte e veja porque hoje estou rouco.