Sorrir?

E mais uma vez eu desperto no meio da madrugada. Ja perdi a conta de quantas vezes me ocorreu. Cabeça procurando razão, peito impulsionado pela emoção. E mais uma noite em claro, gritando por dentro enquanto o silêncio lá fora impera. Já perdi a conta de quantas vezes eu me senti perdido. Esta não é a primeira, provavelmente não será a última, mas é incrível como a intensidade aumenta e aumenta.
As vezes me lembra uma orquestra, silenciosa e calma, com seus acordes e melodias sutis que quase o zunir de uma brisa natural pode ofuscar seu som de tão diminuto que se encontra e de repente, explode em um feroz rugir de trombones e batidas, se fazendo ouvir a quilômetros de distância.
As lembranças tiram qualquer sossêgo. É uma mistura intensa e intermitente de inconformismo com dúvida, de indignação com reação, de revolta com dor, de esperança com desilusão. E não para, infelizmente não para. 
Enquanto isso me agarro a qualquer coisa que me faça não lembrar, porque esquecer ainda é impossível, mesmo sendo provável, e talvez a dor de sepultar tudo que se foi vivido seja mais forte até que a morte, pois ela te pega de surpresa, enquanto o caminho fúnebre de um velório é a cerimônia atestada do fim. Dali pra frente, nada mais.

Não está sendo fácil, como eu já imaginava. Não está sendo simples. Como não foi simples eu abdicar da minha existência para ser existencial a alguém. E de repente, você não existe mais. 
Talvez eu não estivesse preparado para acordar desse sonho, ou talvez eu vivia tal ato mais intensamente do que era na verdade. Como uma paixão que não cessa, amorna mas não esfria. Ou meus olhos me traíam todo o tempo. Deve ser isso. 
Eu registro hoje, aqui, neste meu espaço, um tempo na minha vida tão caótico e incompreensível que o máximo que posso é deixar registrado, na esperança de que um dia, ao reler cada linha, eu perceba o quão difícil era viver, e nesse futuro breve ou distante, eu consiga entender e ligar todos os pontos que hoje formam um labirinto, e não um caminho.

É muito difícil renascer por dentro. Não é simples tal como comer, rezar e amar, quando não se tem apetite, nem fé, ou quiçá uma paixão. A vida não termina sempre em finais felizes. E talvez, muito pelo contrário. Minhas convicções me acompanham para sempre, e é tão triste perceber que o que você tinha como valor e honra, pode muitas vezes te trair, te esquecer, te trocar. E toda aquela certeza de que era realmente sagrado a razão pela qual você se doava, vai por agua abaixo.
Admito, não tardiamente, que nem tudo são espinhos ou tombos. Que ao mesmo tempo que alguns alicerces se romperam e parte de mim desmorona em queda livre, um lado dessa imensa estrutura se mantem forte, respirando e sonhando, com a presença de pessoas especiais que transformam pequenas gotas em uma enxurrada de esperança. Obrigado. Por mais confuso que tudo isso possa ser, dentro desse quebra-cabeças que é minha vida.
Posso admitir que acertei, em muitos pontos, em muitas passagens, em diversas entregas. E já ganhei muito, aprendi muito e conquistei muito. Me moldaram até hoje para ser o que sou, da mesma forma que esses "erros" me ensinam a cada passagem.
Hoje eu apanho mais que bato, choro mais que me pego sorrindo, e sinto uma solidão na alma muito profunda. 
Espero que tudo isso passe, que as alegrias superem as tristezas, por mais clichê que isso é. 
Que as pessoas que ainda enxergam o meu valor, da maneira que for, me guiem a transpor cada abismo, pois não é desmerecedor ter apoio, e que assim eu cicatrize algumas das minhas feridas.

Espero que a angústia dê lugar a ansiedade, da vitória e do sentido. Tudo por uma paz interior, que só quem busca viver de verdade pode entender.
Hoje eu reluto para não aceitar um fim, que talvez possa ser um começo. Ou um recomeço?

Veneno

É angustiante. E eu espero que ninguém sinta tamanha angústia. Pois a vida, quando se perde o sentido, é tão ou mais vazia que a morte. Morte esta que pelo menos te traz o alivio do fim, do descanso e silencio eternos, algo que a vida te priva. 
Te faz sentir a garganta seca e procurar fechar os olhos para fugir de tudo, mas não há fuga, não há saída enquanto seu peito bate
Maldita prisão sem muros, maldita vida que lhe tira tudo e não se justifica. De que adianta anos ao meu rosto, marcado e envelhecido de afagos cruéis, e não de convicções e liberdade de realmente viver. 
Eu não suporto mais. Laços que desatam e sentidos à deriva. Um oceano em fúria de duvidas, sem onde fixar o norte, rumo ao desconhecido, ao redemoinho infinito. 
Porque me tiras a paz? A frieza que estampa o silencio é macabra, um filme de terror real. Mesmo que eu vomite todas as dores que me rasgam a alma nestes dias, continuo atado, é cravado no âmago. 
Me faltam palavras, pois elas não expressam tão límpidas como os olhos, que transbordam de tempos em tempos, e fecham a procura de um avesso que me leve para outro lugar, ou de volta a um passo atrás, onde não havia dor.
Arrancado pela raiz, não se morre em um, ou dois dias. A força mantém tudo correndo entre as veias, enquanto existir como respirar, folhas não secam e murcham. 
Eu não queria que nada disso estivesse acontecendo. Querer é utopia dentro de mim, muitas e muitas vezes refém da minha própria ingenuidade. De vislumbrar a alma enquanto só me enxergam pele. Deveria ser menos, mas não sei. Eu simplesmente acredito.
E são nesses dias longos e sombrios, nas madrugadas em claro enquanto lá fora se cala, que eu travo minha guerra. Sozinho, sem ter pra quem gritar. Pois nossa dor é invisível aos olhos, principalmente de quem não te enxerga, nem hoje, nem nunca.
Quantos dias a mais? Quantas noites a mais? O coração drena, mas drena tão lentamente como escoar um filete de agua ao mar, é quase infinito aqui dentro. Talvez se eu abrisse o peito, talvez se eu arrancasse de mim, mas, não me ensinaram a matar friamente. 
Eu procuro a saída. Juro. Eu procuro respostas. Juro. Arrastando-se em um solo árido e seco. Quem me resgataria de dentro hoje? Maldição!
Se eu dormisse, um sono que me levasse desse pesadelo, e despertasse dessa tempestade como se nada houvesse acontecido, "foi só um sonho ruim", "foi só um sonho ruim". Mas não ha ninguém pra me chacoalhar como tantas vezes eu fiz tirando você desse inferno.
Não, eu ainda não escrevo sobre você, pois as palavras quando chegam aqui são de algo já sacramentado, algo que já é real, e não sei o porque mas ainda não chegou a hora.
Isto agora é só um registro do cataclisma que você proporciona dentro de mim com esta distância muda, este silêncio cruel.
Eu, por mais que deseje não, ainda vivo pra sentir sozinho cada espasmo latejante dessa dor. É angustiante. E espero que ninguém sinta tamanha angústia.

Um dilúvio está por vir? Eu não sou tão forte como gostaria de ser.
 

Teatro Vazio

Tudo isso se apresenta como uma brincadeira sem graça. Eu deveria gargalhar da minha própria tragédia. Fazer piadas com minha vida. Rir para não chorar. 
Eu não quero estar ancorado a nada que me afunde, mas não gostaria de estar a deriva. 
E então o peso das escolhas prensam meu peito, sufocam, incomodam. A falta de respostas traz o clichê da dúvida, e quando há dúvida, não ha propósito verdadeiro.

Não participo, não somo, não influencio, não mudo. O que resta daquele ser, esta se esvaindo e dissolvendo, ainda assim eu reluto. Luto. Preto.
Quantas noites em claro, quantos dias a mais, palavras que assombram, esperanças desesperadas, nem aqui mais me tranquiliza. Aqui, é sim, dentro. 
Sou subjulgado por incompreensão. Sou atacado por defesa. Sou esmagado pelo peso de uma realidade assombrosa que eu reluto em aceitar e que me leva cada dia mais a um beco sem saída. Eu queria achar um ponto reluzente apenas. Um só. Uma fresta.

Não estou sozinho neste deserto, mas caminho a passos largos para uma morte lenta, angustiante e sem dor, muda, calada, dissolvente. Uma flor que murcha com o tempo, sem ser regada, sem forças para sobreviver dentro de um vazo seco e árido. Eu metaforicamente caminho a extinção. A extinção de uma alma é mais dolorosa que de uma vida.

Tudo isso se apresenta como uma brincadeira sem graça. Eu deveria rir das peripécias que a vida me apronta, mas é rir sem platéia. No meu teatro vazio. 
Meus gritos ecoam, meus passos ecoam. Meu choro rebate aos muros e rebate ao rosto, salgado e transparente. 
Um coração que bate atado a um corpo que padece refém de uma mente conturbada, teimosa, briguenta. São dois lados de uma moeda cara ou cara. De nada adianta eu virar as costas para tudo que tenho que encarar se virar significa encarar mais ainda.

Hoje caminho dentro deste teatro vazio apontando com os dedos o lugar marcado de cada um que ali um dia esteve. Lembro seus rostos, aplausos, olhos voltados à mim com atenção redobrada. Talvez vissem talento e futuro onde sequer eu via, mas aos poucos os mais lindos atos perdem força com a repetição. 
Hoje seus lugares não são preenchidos, e um rascunho ficou.

Eu viveria melhor se conseguisse viver, mas a vida pra mim não é tão simples como que pra você. Mais direto que isso impossível, pois você ainda teima em tentar me encaixar dentro de um universo ao qual não pertenço. Uma polaridade repulsiva. Eu nunca vou me encaixar e isto me da medo. Muito medo. 
Ninguém se cura sozinho. Eu sou ninguém. Não tenho forças pra destravar minhas asas, não tenho forças pra repintar meu mundo. Estou refém do acaso, do caso, do improvável provável.

Onde estão vocês? Não mais aqui.
Eu só quero fechar as portas já que ninguém mais vai entrar. Apagar as últimas luzes, desmontar os cenários e encerrar minha peça, de uma vez por todas.

Sonho meu.