Reticências

Angústia, nem sempre má, nem sempre dói, não maltrata, não destrói. Traz a tona às realizações, as metas, as etapas que ainda estão por vir, e revela a linha de onde devo ir, pra onde devo caminhar sem olhar para trás, ou me prender a vestígios de medo.
Hoje eu deixo a angústia pelo futuro me dominar pois sei que a espera não será em vão. Acredito em tudo que acontece, acredito que as passagens e as portas se abrem para quem tem coragem de passar por elas, para aqueles que de qualquer forma buscam sempre mover-se para um próximo estágio, para um próximo capítulo em suas vidas. Eu estou prestes a encerrar mais um desses e vislumbrar o desconhecido.
O combustível que me move, que me empurra me tirando do eixo utópico de uma realidade sem brilho, sem cor, sem pulso, que eu sempre evitei fazer parte, que eu detesto estar, é a visão de uma busca por respostas e propósitos, uma espécie de doença, de vício, do bem.
Atravesso oceanos em busca dos meus rastros, entre conhecer pessoas que a maioria jamais sonha, lugares onde sonhei pisar e respirar aquilo que de dentro da minha mente eu criava como meu mundo. Eu sigo os sinais, as nuances, as pequenas frestas de luz e aproveito os espaços para entrar. Eu não tenho razões além do próprio coração para perseguir e perseguir.
Não posso esperar, não posso desistir, não posso chorar por aqueles que não existem. Não carrego comigo o remorso, a humildade que prende, a fraqueza que impede, a desilusão e conformismo que fuzila o peito daqueles que não se libertam. 
Eu acima de mim, eu acima de você, eu acima de nós. Pois não prospera quem não caminha. Não alcança quem jamais extendeu o braço para alcançar. Não vê quem nunca teve coragem de abrir os olhos. Eu acima de uma realidade pobre de realizações, de histórias, de passagens. Eu quero meu livro repleto de tópicos e marcações. Almejo coisas que talvez destorçam seus princípios e seus conceitos de felicidade. A sua não me trás nada, não me acresce, não me inspira, não me motiva. É fria, vazia, sem altos e baixos, como uma estrada reta terminando em um precipício. A minha vida é uma montanha-russa, verdadeira, a qual eu encaro enquanto você se diverte com as falsas. E dizem que não tenho coragem.
Talvez a minha coragem seja tamanha que me traz a tal angústia, pois eu sou refém da minha própria loucura e busca. Nada me detém, nada me transforma, nada me leva a trair minha alma, meus batimentos dentro do peito.
Não será apenas mais um adeus, não será apenas se separar dos que ficarem, não será apenas aceitar as mudanças necessárias. Será glória perante dúvida. Será luta ao invés de joelhos ao chão. Será olhos focados à frente, ao que me faz sentir vivo. Ao que me faz único.
Talvez eu nunca cresça aos olhos daqueles que vêem o sucesso como algo visível. Talvez eu nunca alcance também detalhes que me ajudariam a ser quem eu sou, mas eu não preciso buscar a perfeição. Não preciso de ninguém me dizendo quem eu sou, sem ao menos um dia ter tentador ser. 
Talvez eu leve anos até descansar, talvez eu esteja ainda na metade da minha existência. Mas posso estufar o peito e dizer que vi, assisti, e vivi coisas improváveis de onde vim, inalcansaveis aos que me rodeavam, inaceitáveis aos fracos e invejosos. Eu não sinto o remorso, ele não existe. E enquanto alguns tentam de alguma forma achar um fim para apenas um capítulo, eu estou com reticências.
A angústia que me tira o sono é o sinal da mudança. É a passagem que de tempos em tempos aparece a minha frente e me deixa um simples recado:
Siga em frente.


Crescente

Da próxima vez eu serei tão forte que me erguerei e permanecerei firme sobre meus pés, sem que nada ou ninguém me derrube. 
Tão forte que não sentirei dor, perda, remorsos, pena. E as viradas da vida não me farão sofrer. E eu não perca as alegrias pelo caminho, trazendo mais um pesadelo.
Um redemoinho, torce, aperta, maltrata. Eu queria ser mais bravo, forte, tão seguro diante dos fatos quanto diante da  verdade. Não odiar, não expor, não passar por buracos tão pequenos que me esmagam.
Travando uma guerra constante, quem sabe ao certo pelo que eu luto, só meu Deus. Só quem me dá forças é capaz de entender e me empurrar, me lançar aos desafios. Onde eu vou estar?
Tão inconstante. São viradas bruscas, arremessando minha alma contra as paredes. Eu preciso destruir este bloqueio. Eu quero ser o meu próprio salvador. Meu próprio juiz. Minha sentença.
Um coração forte feito para resistir aos comandos e as pressões de uma cabeça tão tão feroz, que explodiria se eu deixasse. Uma chama ardente que é capaz de matar. 
Eu, refém, eu, refém. No arrependimento, na passagem, no que faço, desfaço, começo, termino. Acendo e apago antes de iluminar, de brilhar, de trazer claramente as verdades, ofusco. Deixo queimar por dentro como uma folha se estinguindo. 
Meu som, meu refúgio, minha inspiração. Me trás a tona aquilo que existe invisível. Que me abre os olhos e me insere dentro de um mundo silencioso.
Nada termina após existirem lembranças. Eu desejo esquecer os dias, as palavras, as passagens, mas não existe saída quando foi preso dentro do coração. É um infinito sim amputando um não.
Remorsos jamais. Saudades pra sempre. Dos tempos em tempos. Do som de vozes que jamais se calarão. Eu espero desde ja apenas lembrar e pensar que transpus.
Se eu pudesse escolher, escolheria a mais pura ignorância ao invés da tenebrosa lucidez. Escolheria ser brando ao invés de ardente, ou apenas seguir caminhos planos. Mas eu não controlo o que os céus desejam, portanto sigo meu caminho, sigo meu próprio destino.
Pegue minhas mãos, me guie, me dê forças enquanto os lados desmoronam. Me abrace, forte, não me deixe ir além do que nós merecemos. Eu preciso e quero, eu aceito mas prefiro sem sofrer. Se eu puder escolher, que seja pelo menos agora. Não haverá sucumbir, e sim, prevalecer.
Quero num futuro distante olhar para trás e entender cada passo, cada lágrima, cada aperto no peito, cada perda, cada adeus, cada desistência e despedida. Cada ponte que transpus até chegar onde eu merecia. Eu mereço!
Quando vocês ouvirem minha voz. Quando entenderem além daquilo que vêem, através dos pequenos pedaços, enxergando o tamanho disso tudo, haverá tanto perdão e ao mesmo tempo raiva por terem sido tão ásperos quando a saída era apenas aceitar. 
Da próxima vez eu serei tão forte que um só sorriso vai dizer tudo aquilo que eu precisava dizer. E no exato momento antes de eu fechar os olhos pela ultima vez, me dêem apenas um sinal de que tenham entendido meus passos até ali.
Eu vou descansar em paz.

Vampiro

Houve um tempo, décadas atras, que não existiam consequências, apenas sede. Necessidade pura e simples de juntar conquistas, de ouvir as palavras certas, de sentir os murmúrios e os joelhos no chão. Não existia o "não", mas sim o "quando".
Não havia arrependimento, não há culpa, só a vitória. O certo e o errado foram mesclados e destruídos ali, dentro da insana obsessão. Dentro daquele tempo espaço onde era refém de si. 
A conquista vicia. Transforma você em escravo do "sim", do antes impossível, do chamado proibido. Não há barreiras. 
Evolução na arte da destruição, de sonhos, de perfeição, de família, união, verdadeiramente falsas ao seus olhos. Era a sede de conquista. Alguém a procura de destruir qualquer um que dissesse algo que lhe prejudicasse, que ele sentisse como desaforo ou ataque. Ele arrancava o que havia de mais digno, e da forma mais cruel e sádica.
Trazia para perto aquelas que eram soberbas, prepotentes, exibidas, arrogantes ao ponto de deixa-los aos pés. Todos? Quase todos. Ele as fazia sucumbir, ao seu modo, seu jeito, sua técnica impecável. As maiores lobas foram abatidas, domadas, de quatro ao seu comando. Era mais uma vitória.
E o prazer aumentava a necessidade, um vício sem controle, um refém de seus próprios desejos. Ele queria mais, e mais, e mais. Aquelas que se tornavam impossíveis aumentavam o desafio e o desafio aumentava o objetivo, e no final, triunfo. 
Não existiam as que eram de outros. As que estavam em mãos alheias às dele eram de mais valia. Objetivo redobrado e meta traçada. Ele queria destruir a idéia comum de união.
Introduz, apresenta, cerca, joga, cativa, conquista, vence.
A paixão o cercava, trazia a frustração daquelas que não teriam os desejos realizados. Porém nunca existiram falsas promessas, falsos comprometimentos. Era clara intenção, como era clara a consequência. 
Naquela época a paciência era virtude, a espera era recompensa, e o prazer era prêmio. Um risco intenso e eminente, uma delicia sem fim.
O proibido é doce como mel, lambuza, escorre, vicia. O improvável é apaixonante, olhos nos olhos com quem ninguém espera. Histórias que são segredos para quem as vive. Verdades que são mentiras pra quem não as soube. Esses são os trunfos imortais, por mais que os anos passem, as memórias ficam, as lembranças adormecem mas não morrem, revivem a cada vontade de renascer.
Houve um tempo em que ninguém era mais sincero e canalha, fogo e brasa ardente que acorrentava qualquer que quisesse ser tida como vítima. 
Seus homens eram objetos usados como instrumento de lembrança, lhes traziam a tona a imagem dele. Feche os olhos e imagine, suspire e diga seu nome, trema e denuncie quem te fazia mulher. Com os olhos fechados não existe traição.
E elas cobravam, exigiam mais, pediam mais, viciavam. Alimentavam ainda mais a volúpia e desejo, saciava o vício e mantinha a chama acesa. Um círculo infernal.
Daquelas histórias algumas sepultaram. Chegaram ao ciclo final. Sem mais capítulos. 
Mas as páginas escritas jamais poderão ser apagadas. Arrancadas talvez, mas o que aconteceu nunca será tirado de dentro das lembranças daquela época. 
Houve um tempo em que ele aprendeu os segredos que levará para vida toda. E todas as armas que aprendeu a usar hoje estão sobre a mesa. No final a vitória vai ser sempre em silêncio.

Retrato V

Eu aprendi muito esses últimos anos.
Vendo as pessoas que me rodeavam, o que elas achavam importante, a que elas se dedicavam, e fui percebendo que era tão vazio e sem propósito. E fui entendendo que aquilo não era para mim, que meus valores iam alem de status, de necessidade de ter dinheiro para se mostrar "bem"ao olhos dos outros. Descobri que eu procuro algo maior, uma paz interna e satisfação que vale muito mais que qualquer nota de 100, e que me desprendendo da necessidade e da obsessão, dessa ganância covarde que é imposta e que muitos aceitam, eu me encontraria e entenderia meu propósito. Eu me entendi, descobri meus limites e assimilei as conseqüências.
Acho que se você pensa em mudar, não deixe que os "e se" dominem sua mente. Eles são as travas impostas não por você, mas por toda a falsidade que nos circula, que nos mantém presos ao sistema impedindo qualquer um de pensar, agir, ou evoluir além do que lhe é "oferecido". Feche a porta atrás de você, que a da frente vai se abrir, e se por acaso ela não abrir meu amigo, mete o pé, porque as vezes, existe a necessidade da coragem e não só da oportunidade.
Tente não perder os avisos que a vida lhe da, as dicas que são postas em seu caminho, para que você siga por outra estrada. As respostas estão dentro da gente, e por mais estranhas que elas possam ser, elas são verdadeiras. Por mais objeções que você faça, e questione, não tenha receio, caminhe.
O que vejo são pessoas arruinando suas vidas, criando empecilhos para evitar dar um passo à frente, por medo, insegurança, incapacidade e preguiça. Se acomodar atrasa demais, aceitar, atrasa demais. Esperar atrasa demais.
Eu aprendi que me livrando do desespero imposto pelo ambiente que me cerca, eu conseguiria observar tudo que acontece ao meu redor, filtrar tudo aquilo que me fazia bem e me ajudava a aprender, e jogar fora a maioria dos exemplos errados, de toda e qualquer espécie. No entanto, aprendi também a manter próximo alguns desses erros, dessas pessoas, sempre a vista, para que eu jamais esquecesse das falhas e não repetisse ou começasse a errar. Olho, analiso, aprendo, filtro.
Veja, eu não sou perfeito. Longe disso. Não quero aqui dar receita alguma de sucesso, pois o meu sucesso provavelmente não é o sinônimo do seu. Apenas deixo aqui registrado, aquilo que eu ando fazendo ultimamente para tentar viver em paz e fora dessa agonia insana que a maioria se afunda. Eu já fui assim, e demorei quase uma década para perceber os erros, e só após experimentar o outro lado, eu consegui dar conta do que me prejudicava. Talvez você, que leia, esteja a procura de uma saída, ou pelo menos de respirar melhor. Se ainda continua lendo, é provável que pense um pouco diferente daqueles que eu repudio.
Nestes últimos anos, entre picos de alegria e abismos de tristeza, eu procurei respostas as minhas perguntas mais simples, as minhas dúvidas mais coerentes. Eu queria encontrar razões. Razões até para entender e aceitar pessoas e atitudes erradas, entender que elas nasceram para co-existir e que não existe realmente a possibilidade de todos "brilharem". O nosso planeta é povoado, e é aceitável de certa forma que a grande maioria se torne e viva apenas como "massa de manobra", termo na moda ultimamente. Mas eu nunca aceitei. Talvez por isso que eu desenvolvi tantas e tantas dúvidas e questionamentos, auto analise afiada e percepção aguçada. Sim, eu me considero inteligente, e isto não é soberba, é ser confiante.
Eu não consegui mais tolerar palavras que destoam de atos, idéias que se agrupam, atitudes robóticas e vontades questionáveis. Eu fui afastando, me afastando, e sendo afastado. Eu já disse isso uma vez, ou talvez mais que uma, mas a realidade irrita as pessoas. A verdade, incomoda demais. E eu me tornei uma pessoa difícil de digerir. Porém ao invés de lutar contra isso e sucumbir a uma falsa necessidade de aprovação por parte dos outros, eu aceitei. Ao meu lado, ou pelo menos próximo, vão sobrando aqueles que pensam um pouco diferente, que possuem outras visões, que possuem coragem e deixam sua existência perceptível.
Procuro fazer hoje em dia o que gosto. Registro meus pensamentos, apresento minha cara, falo do que gosto, escrevo sobre o que falo, critico o que não concordo, ignoro o que perco a paciência e o mais importante - aprendi a me desapegar das pessoas. Talvez isso soe cruel demais ou egoísta demais, mas só assim eu consegui realmente exorcizar meus demônios do passado, deixando quem passou, passar. Minha paciência para tolerar esta curtíssima, ando no fio da navalha, com as garras a mostra, com a língua afiada ao menor sinal de deslize, e sinceramente, eu gosto. Hoje mostro na cara aquilo que incomoda, as atitudes erradas, as promessas não cumpridas. 
E aqueles que não gostam, que apontem o dedo. Que digam de mim e contra mim, mas que digam verdades.  Sou mentiroso? Falso? Aproveitador? Vagabundo? Não tenho palavra? Hipócrita? De má índole? Irresponsável? Mal educado? Ignorante? Invejoso? Muito provavelmente não. E isto incomoda. Pois a melhor resposta vem quando os outros são incapazes de lhe julgar. Quando os outros são incapazes de lhe dizer que realmente você faz o mal, você age errado ou fez o mal pra alguém. Não, não vão achar. Exclua daí antigos amores femininos frustados por não terem o que gostariam da forma que gostariam, e foram incapazes de me fazer acreditar que queriam, e rapazes que tiveram suas "dignidades" roubadas da melhor forma possível, enquanto se preocupavam em "fazer minha caveira", eu me preocupava em agradece-los por suas fêmeas. Obrigado, "amigos". Isto nunca poderá ser apagado. Lembranças são inatingíveis. Engulam.
Hoje eu estou sossegado. Mais calmo. Mais brando. Acertando os ponteiros para um novo capítulo. Passando borrachas, deixando as linhas de rascunho em branco, para novos parágrafos, novas histórias. Hoje eu me retrato e me auto afirmo como uma pessoa a caminho da vitória, da minha vitória, sem falcatruas, sem resultados combinados, sem dignidade roubada. Apenas aceitando-me mais e mais a cada dia, e no fim das contas, eu vou poder dizer que nasci e morri sendo verdadeiramente honesto comigo. 
Mais histórias estão por vir. 
E eu continuo afiado.