O Menino e o Muro


Ofegante.
Assim que ele se sentia por mais uma tentativa. Os olhos ardiam, a poeira que levantava cobria seu corpo, e seus dedos apertavam suas mãos de uma forma a misturar dor, e ódio. Olhar fixo, como o caçador espreitando sua presa, pronto para o bote final.
Mais uma tentativa, queria provar a si mesmo que era capaz, mas sabia das dificuldades, sabia que sem as ferramentas necessárias, transpor esta barreira se tornara um ato único em sua vida. Um ato para vida inteira. Impulso. Salto. Seus dedos rasgam ao toque áspero do concreto, não se agarram, deslizam inquietos por cada vão, e seus pés, mesmo calçados, não achavam a base para um ultimo impulso.
A poeira novamente cobre seus olhos, agora lacrimejantes. O fio de esperança havia se perdido. A dor supera a força, a vontade, a luta por aquilo que se sonha. E sonhar ele havia conseguido, e muito, ao olhar lá de baixo os ventos que sopravam por sobre o topo. Ventos quentes, os mesmos que traziam refletidos os raios de sol, e que faziam ele suspirar.
Socos, não, socos não ajudam meu jovem rapaz, apenas adubam as feridas, e as deixam ainda mais abertas e doloridas. Não, meu jovem rapaz, poupe-se da escárnia.

De costas ele sentou-se, e lembrou que por um dia, por um único momento, seus braços esticados ao ponto de se soltarem dos ombros, lhe deu a chance de alcançar o topo, e um fio de energia puxou seus olhos, que deslumbraram, sem entender, hipnotizados e descrentes, tudo o que ele sonhava, e por ali ele ficou, contemplando, trêmulo, até desfalecer exausto de esforço.
Do outro lado meu jovem rapaz, alegria, amor, louvos e fardos. Pinturas puras, flolhagem sóbria e sutil. De que adianta se pensar?

Das mãos cobrindo a face, escoam lágrimas rosadas.
As mais puras e tristes, vindas da mistura do sangue vivo e turvo, com rios cristalinos, que brotam sem fim dos olhos que subornados, cederam a realidade minutos depois.

Tão alto não, meu jovem rapaz?
Um dia quem sabes cresça ao ponto de com apenas a força de seu peso, desmorone toda a angústia que lhe cobriu a vida infantil, e assim, por sobre as pedras, e cascalhos, por sobre os restos marcados de seus dedos, seus pés transponham a tão impiedosa barreira.

E ao sentir a brisa que antes passava lá em cima, tocar seu rosto como mãos de veludo, você, sorria.